a ficção, em tese

Como pesquisador, leio várias teses nas minhas áreas de interesse, mas em geral, o acréscimo ao conhecimento por elas trazido é muito muito baixo, próximo ao desanimador. É raro pintar uma diferente, com boas questões e proposições:

“Esta tese pretende sustentar que as ficções não são um discurso rival ao da realidade, da verdade e do conhecimento científico e que, portanto, não podem ser entrincheiradas em acepções que as asssociam à ilusividade, à fraude, à mentira ou à falácia.

Considerando que não há nenhum fundamento primeiro a engendrar o conhecimento, a não ser a sua instância ficcional facultada pela ação possibilitadora do estético – uma categoria que será discutida a partir do recorte estabelecido pelo filósofo Wolfgang Welsch -, verdade, conhecimento e realidade serão problematizados no marco das leis da ficção, em virtude da modelagem que realizam no material do mundo, forjando, alterando e intermediando nossas relações individuais e coletivas, além de organizarem os repertórios culturais das sociedades e sistematizá-los em modelos a serem compartilhados.

O conhecimento e a verdade, por sua textura ficcional, passam à condição de categorias estéticas, o que nos remete à compreensão da ciência como um campo de estetização que opera com noções e conceitos conhecidos e disponibilizados pela arte.”

[ ? ] Ainda não descobri quem é o autor/autora. Desconfio, por similaridade, que é Martha Alkimin, professora adjunta do Departamento de Ciência da Literatura da UFRJ.

úi que política ou wiki política

Começo a pegar gosto pelas eleições. Se não há novidades ou nada que encante entre os candidatos, para os eleitores que disponham de acesso a internet o momento oferece condições de aprendizado e intervenções como nunca existiu antes.

wikipolitica

Ainda outro dia, eu falava aos amigos que atuam nos Comitês de Combate à Corrupção Eleitoral, no Acompanhamento de Governos e na proposta de Refundação do Legislativo sobre como seria interessante um espaço para partilharmos idéias e experiências tipo Wiki. Já temos.

Agora é tempo de se apropriar da ferramenta, dos conceitos de colaboração que ela embute, e ver o que é pertinente e possível produzir, coproduzir. A dica vi pelo olho-dínamo.

voto livre: acima e adiante

ministro marco aurelioNo RodaViva da Tevê Cultura, ontem, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Marco Aurélio de Mello, repetiu seu bordão predileto sobre o voto facultativo: “O voto é um direito, não um dever”.

Gostei disso, mas lembro que não é novidade: nos últimos tempos da ditadura militar, a oposição, nas figuras de FHC e Lula, entre outras, defendia a idéia. Saber se esqueceram quando chegaram ao poder ou para chegar lá é que é difícil.

Já temos história suficiente sobre o voto obrigatório – de momentos de exceção aos supostamente ideais – para ver que ele só serve ao pior tipo de continuísmo: quem vota a contragosto vota mal.

planetas, satélites, mundos

A novidade do dia – que já explicaram, não altera o dia a dia – é a mudança de categoria de Plutão. Uns dizem rebaixamento porque ele deixou de ser Planeta, mas isso é pura mania humana de a tudo hierarquizar, seja na Terra como no céu.

via lactea

A recategorização revela o quanto ainda somos auto-referentes, isto é, nem passou pela cabeça dos 2.500 astrônomos reunidos em Praga questionar se a Terra ainda é um planeta. Tenho minhas dúvidas e meu argumento é o seguinte: existe outro corpo celeste no universo que fabrique seus próprios satélites e produza lixo espacial? Planetas fazem isso?

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Falar em satélites, aí está a primeira imagem da Terra feita da Lua (precursora das que inspiraram o presidiário Caetano Veloso). Sabe quando foi tirada? 23 de agosto de 1966, exatos 40 anos e um dia atrás.

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aula de português

A linguagem
na ponta da língua,
tão fácil de falar
e de entender.
A linguagem
na superfície estrelada de letras,
sabe lá o que ela quer dizer?

Professor Carlos Góis, ele é quem sabe,
e vai desmatando
o amazonas da minha ignorância.
Figuras de gramática, esquipáticas,
atropelam-me, aturdem-me, sequestram-me.

Já esqueci a língua em que comia,
em que pedia para ir lá fora,
em que levava e dava pontapé,
a língua, breve língua entrecortada
do namoro com a prima.

O português são dois; o outro, mistério.


Carlos Drummond de Andrade
Obra Poética, 7º Volume

embebedai-vos

(XXXIII) – Charles Baudelaire

baudelaireÉ preciso estar-se, sempre, bêbado. Tudo está lá, eis a única questão. Para não sentir o fardo do tempo que parte vossos ombros e verga-vos para a terra, é preciso embebedar-vos sem tréguas.

Mas de quê? De vinho, de poesia ou de virtude, a escolha é vossa. Mas embebedai-vos.

E se, às vezes, sobre os degraus de um palácio, sobre a grama verde de uma vala, na solidão morna de vosso quarto, vós vos acordardes, a embriaguez já diminuída ou desaparecida, perguntai ao vento, à onda, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que passa, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntai que horas são; e o vento, a onda, a estrela, o pássaro, o relógio, vos responderão: “É hora de embebedar-vos! Para não serdes escravos martirizados do Tempo, embebedai-vos, embebedai-vos sem parar! De vinho, de poesia ou de virtude: a escolha é vossa.”

Pequenos poemas em prosa, Record, 2006, tradução de Gilson Maurity. Achado no Calíope.

é contra, eu apoio

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Apoiaria mesmo que fosse Semana de Contra Jornalismo ou Semana de Jornalismo do Contra. Não importa. Melhoria das condições de ensino é uma reivindicação de toda sociedade, pra sempre. Cursos faz-de-conta, que sumam!

Interessante é que os alunos que não aprenderam nada sobre jornalismo fazem uma rica denúncia da precariedade do curso: matérias que não têm professor, professores que abandonam as aulas, falta de equipamentos. O que leva a pensar: se eles não soubessem comunicar, teriam organizado o protesto?

A programação é bacanuda e se encerra na sexta-feira com o simbólico enterro do curso de jornalismo da ECA, cujo site não faz menor menção ao evento, razão a mais para apoiá-lo.

floresNesta também simbólica coroa de flores registro, porém, minha única discordância com os estudantes, que grifam em seu manifesto: Não deixaremos o curso de jornalismo da USP morrer! Ora pois, que então montassem uma UTI, um sanatório, não um enterro. O negócio de ressuscitar rola em outra área, não na escola.

Nos meus tempos de estudante (oficial) de comunicação, quase trinta anos atrás, eu adoraria simplesmente ter concluído o Curso de Comunicação com as matérias que eu mesmo escolhesse, mas fui obrigado a optar por uma das três áreas: jornalismo, propaganda ou relações públicas. Se na época eu já achava esses campos restritos, imagina hoje.

o rótulo riqueza

deformameNo embalo do post anterior, passei a pesquisar a polissemia – variação de significados – da palavra riqueza. É fácil fazer isso, embora um tanto quanto insano, a partir dos sites de pesquisa na internet. Digite riqueza, lixo ou drogas, e pire com a profusão de usos de qualquer palavra dessas.

Mas a busca tem lá suas justificativas e objetivos. A idéia de ser rico, afinal, molda o desejo e a razão de viver de muitas pessoas, ao mesmo tempo em que desperta asco e preconceito em outras. Por que?

Do sinal ao significado

Num plano bem genérico, riqueza é um conjunto de valores, porém, nos principais dicionários e na wikipedia (valha-me!), o foco é dado ao acúmulo de dinheiro e de bens materiais: riqueza é definida como concentração de posses.

Fora dos almanaques, digo, na vida real, é bem fácil negar essa versão pela simples constatação de que uma pessoa pode ter uma infinidade de propriedades, uma fortuna incalculável, e mesmo assim ser um tremendo vazio, ter uma expressividade humana nula, prejudicada, enfim, ser muito muito pobre de alma.

Em outras palavras, possuir bens é sinal de riqueza, mas isso não significa automaticamente que a pessoa seja rica. Assim penso eu, claro, a despeito de dicionários e wikipedias da vida e, também, de grande parte do imaginário social. Tô nem aí.

Bom, voltando à busca, ela começa prometendo diversão a valer, pois já parte de um paradoxo, quase um choque: no topo da lista de nosso confiável Google quando se digita riqueza surge o último lugar em que poderíamos encontrá-la. Veja só:

Riqueza.com.br irá te fornecer todas as ferramentas para você extrair com inteligência cada gota de lucro de seu site. Se você recebe visitantes em seu site, você tem o direito de lucrar com isso. Mais do que um direito, é seu dever!

Écat. Coisa mais repugnante. Nem uma contrapropaganda ilustraria melhor a idéia aqui perseguida: de que nem todo lucro se transforma em riqueza. No próximos posts sobre o tema, prometo escolher exemplos melhores, mais saudáveis, ricos. 😉

os novos indicadores de riqueza

riquezaMais um livro na fila de leitura para quem se interessa em retrabalhar conceitos de riqueza, tão mal alojados nas mãos dos donos do capital.

Os autores propõem análises dos instrumentos de indicação de riqueza dos países que levam em conta impactos ambientais e sociais causados pelas atividades dos diversos setores de produção.

Veja o comentário de Ladislau Dowbor, que escreveu o prefácio da recém-lançada edição brasileira:

“Pela primeira vez, estamos realmente medindo a utilidade social das nossas atividades. Uma sociedade onde a economia vai bem, mas o povo vai mal e o planeta é dilapidado, é evidentemente uma sociedade sem rumos. Construir sistemas simples que permitam à população saber se está vivendo melhor ou não, tem imensa importância”.

mais um partido?

Hoje na Folha Ilustrada, por Marcelo Coelho:

[…]
Idéias, programas, princípios prontos para usar, adquiridos e formulados rapidamente por especialistas no ramo. Uma sigla, uma marca, de fácil memorização. Um horário conseguido gratuitamente na TV. Um líder carismático. Uma burocracia estável de colaboradores e advogados. Uma militância disciplinada: os criminosos se politizam.

Enquanto isso, os políticos se criminalizam. O escândalo dos sanguessugas mostra com clareza que, mais do que se entregar a um grande programa de conquista de poder, ou de manutenção de determinado sistema social, parcela importante dos políticos se dedica a um varejo de ilegalidades, bicando verbas de uma ambulância ali, de uma empresa de ônibus acolá, sem recorrer a nenhum discurso nobilitador como o agora adotado pelo PCC.
[…]

tecnografia

Certas expressões mais vale ilustrar que definir:

Foi José Veríssimo quem publicou o primeiro artigo de análise de Os Sertões, no Correio da Manhã, do Rio de Janeiro, em 3 de dezembro [1902]. Veríssimo abordou o livro de Euclides da Cunha como obra de literatura, história e ciência e estabeleceu um padrão de leitura que seria seguido por muitos intérpretes. Apesar dos elogios à qualidade de poeta, romancista e artista do autor, fazia reparos ao abuso dos termos técnicos, das palavras antigas e inventadas e das frases rebuscadas, julgando o seu estilo muito artificial e gongórico.

Euclides respondeu a Veríssimo, em carta do mesmo dia. Agradecia a crítica, mas defendia o emprego de termos técnicos e a aliança entre ciência e arte, que considerava a tendência mais elevada do pensamento. Convencido de que a expressão artística exige notação científica, achava necessário criar uma “tecnografia própria”, capaz de unir as diversas áreas do saber: “o escritor do futuro será forçosamente um polígrafo”.

Fonte [ pdf ]: concursos cespe.

A história de Canudos seria diferente se Euclides da Cunha tivesse nas mãos um celular, uma filmadora, um notebook e na rede, um blog. Aprender a manejar esses instrumentos hoje é tão importante quanto saber ler e escrever.

..^..

sertoesPor acaso, cheguei no último dia do evento (via net). Na programação local consta a 67ª Maratona Intelectual Euclidiana, pela manhã, na sede do Rio Pardo Futebol Clube e o encerramento à tarde com uma Romaria Cívica que sai da Casa de Cultura Euclides da Cunha e termina no Recanto Euclidiano, com Festival de Fanfarras Rio-Pardenses.

Homenagem da província ao filho universal.

rumos da tevê

No Arte SESC Flamengo – Rio de Janeiro.

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O evento irá discutir aspectos ligados à implantação da tecnologia digital na televisão brasileira, desde a adaptação dos modelos de negócios até as plataformas de transmissão.

Profissionais de radiodifusão, telecomunicação, engenharia e comunicações irão encontrar no fórum a oportunidade de travar conhecimento do estágio de implantação da TV Digital no país, conhecer as oportunidades oferecidas e aprofundar as discussões sobre a aplicação das novas plataformas.

dia do pai

Permito-me, como pai, singularizar esta data, tremendo 13 de agosto, e escapar do jogo mercadológico que se faz em torno. Se merecemos reconhecimento e comemoração, não creio que seja nos moldes incentivados pelo comércio, via o artifício dos presentes comprados.

Sempre disse aos meus filhos que preferia um desenho, texto ou escultura (já fizeram até com mandioca), uma geringonça qualquer que fosse de sua própria expressão e elaboração, por mais ‘pobre’ que pudesse parecer (e nunca parece porque nunca é).

Não que eu rejeite camisetas, livros, cedês ou algo no estilo que me chegue com carinho, mas porque essas coisas, no final, induzem à uma saída fácil (fora o desembolso financeiro e a camelada) e a uma certa preguiça de elaborar o que se sente, que pra mim é onde a coisa mais pega.

celulaEnfim, blablabá. Esse post foi para contar como começou meu dia: minha filha menor falando que amanhã tem prova de ciências e que gostaria que eu a ajudasse a estudar, depois do almoço. O assunto da prova é células, a dificuldade está em compreender as organelas, já ouviu falar?

“Bem, eu respondi, o que posso é aprender com você, pesquisarmos juntos, pois quando tive isso na escola – faz tempo – sabia-se muito menos e ‘ensinava-se’ de outro modo, resumo: se alguém me ensinou, já esqueci”.

E taí, para quem quiser saber mais sobre organelas. Sobre saber como ser pai, é esse dia a dia que vale mais do que qualquer comemoração, que nos ensina. Interessantes, as organelas.

rebola bola: paixão pelo futebol

rebola bolaMesmo quem não curte futebol ou, como eu, já curtiu e desencanou, não pode se afirmar desafetado pelo esporte, por tudo o que ele representa e interfere na cultura, na política e na economia nacional e mundial.

Assim, não é estranho que cientistas sociais, antropólogos, historiadores e outros estudiosos se dediquem ao fenômeno futebol, compondo novas e interessantes visões no último Dossiê ComCiência. O texto que mais gostei trata do despertar e da canalização da paixão pelo futebol, e das gozações e expressões de preconceitos que ela traz à tona.

brasil x argentina “O futebol permite, em certa medida, uma desculpa para ser preconceituoso sem ser tão politicamente incorreto. É como se o futebol criasse uma espécie de exceção, em que pode-se falar tudo, porque, no fim, é só futebol”, assinala o antopólogo Renó Machado. O texto comenta o destempero irônico vazado pela imprensa entre alemães e italianos, bem mais divertido e estiloso do que as manjadas tiradas entre brasileiros e argentinos.

Posts antigos sobre o tema:

-> a graça do futebol

-> caixinha de surpresas

wordpress: posts relacionados

Mais uma novidade interessante para blogueiros wordpress: no painel de controle você pode ver posts de outros blogs que se relacionam ao que é publicado no seu. A proposta é ótima mas a resposta ainda é fraca: dos vinte posts listados, apenas dois eram de meu gosto e interesse:

– Smooth, Santana & Rob Thomas

É verão no norte! (e ao sul também). Bóra dançar.

santana.png

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e, depois do puroprazer, o prazer de ler coisas úteis para o trabalho:

– Web Standards vs Tableless

Duas bolas dentro em vinte tentativas:
10% de acerto. Tá bom prá começar.